Por Kauê Guella Buso, Diretor de Novos Negócios – Juscon Contábil
A Receita Federal do Brasil (RFB) publicou recentemente a Portaria RFB nº 555/2024, revogando a antiga Portaria nº 208/2022 e inaugurando uma nova fase na política de transação tributária. Com as mudanças, observamos avanços significativos no estímulo à regularização fiscal, mas também novos desafios e exigências que impõem maior estratégia por parte dos contribuintes e seus assessores jurídicos e contábeis.
Acesso Ampliado à Transação Tributária
A principal inovação positiva foi a redução do valor mínimo para propostas e acordos individuais, que caiu de R$ 10 milhões para R$ 5 milhões. Isso representa um marco relevante, pois amplia o número de empresas aptas a negociar diretamente com a Receita Federal, democratizando o acesso a esse importante instrumento de regularização fiscal.
Exigências Mais Estritas e Técnicas
Apesar do avanço em termos de acesso, a Portaria também trouxe condições mais rigorosas, que devem ser cuidadosamente analisadas:
- Identificação de Grupos Econômicos: A Receita Federal poderá exigir que o contribuinte declare a composição de seu grupo societário — de fato ou de direito — como condição para a celebração do acordo. Essa exigência mira maior transparência, mas também pode revelar riscos de responsabilização solidária.
- Prejuízo Fiscal e Base Negativa: Embora ainda seja possível usar prejuízos fiscais de IRPJ e bases negativas de CSLL para abater valores, isso passa a ser tratado como medida excepcional. A empresa deverá justificar a “imprescindibilidade” desses valores no plano de regularização — alinhando-se, assim, à postura já adotada pela PGFN.
- Empresas em Recuperação Judicial: A antiga regra de presunção de irrecuperabilidade dessas empresas foi flexibilizada. Agora, será considerada a capacidade real de pagamento da massa falida, baseada nos bens e direitos disponíveis — o que poderá limitar o alcance dos benefícios em alguns casos.
- Benefícios Atrelados à Capacidade de Pagamento: A concessão de descontos e benefícios será vinculada exclusivamente à capacidade de pagamento aferida ou presumida, afastando-se da abordagem mais moderna da PGFN, que permite considerar também o potencial de recuperação das dívidas.
- Manutenção da Regularidade Fiscal: Como condição obrigatória para a vigência da transação, o contribuinte deve manter a regularidade fiscal perante a Receita Federal. Havendo novos débitos exigíveis, o prazo para regularização será de 90 dias — exigência que demanda vigilância contínua da empresa.
Editais Complementares: Novas Oportunidades Até 2025
Dois novos editais complementam esse cenário, com validade até 31 de outubro de 2025:
Edital nº 4/2024 – Pequenos Contenciosos (até 60 salários-mínimos)
A sistemática prevê descontos de 30% a 50% conforme o número de parcelas, com prazos que chegam a 55 meses. O modelo beneficia contribuintes com menor passivo tributário e oferece incentivos proporcionais à agilidade do pagamento.
Edital nº 5/2024 – Contenciosos de até R$ 50 milhões
Mais complexo, esse edital estabelece descontos de até 100% em multas, juros e encargos legais, com teto de 65% do valor total do crédito. Em casos excepcionais, a redução pode alcançar 70% com pagamento em até 145 meses. Também é admitido o uso de prejuízo fiscal e base negativa para abatimento de até 30% do saldo devedor após os descontos — ponto ausente no Edital nº 4.
Considerações Finais: A Hora de Planejar é Agora
A nova sistemática de transação tributária exige análise técnica aprofundada e planejamento estratégico. O uso cumulativo das modalidades está permitido, o que amplia as possibilidades de negociação — mas também a complexidade da escolha da melhor alternativa.
Empresas que buscam regularizar sua situação fiscal devem agir com prudência, avaliando os riscos e benefícios específicos de cada modalidade e alinhando suas estratégias ao perfil financeiro atual.